A sombra ágil movia-se entre os guetos de luz consentidos pelo sol. Misturava-se aos plátanos, desenhava-se pelas telas de chão batido e por vezes se escondia.
Presa a um corpo , à sombra restava fazer desenhos na trilha e refletir-se nos transeuntes, nos postes ou nos olhos de mel de um cachorro sonolento. Só ele a perceber seu rastro.
Andava à frente orgulhosa , o sol em perspectiva brincava com ela , como num jogo , logo se via seguindo o corpo da mulher até que tudo era engolido pela sombra.
Dançava entre as folhas um balé estroboscópico. Brincava, ao contrário da imagem grave que caminhava indiferente a ela. Onde iriam tão rápido? Uma sombra de dúvida.A sombra era um avesso reflexo que simulava um mundo paralelo e sem tintas. Nascida de um foco de luz, era nua e negra, diáfana e sobretudo silenciosa. Prisioneira submissa de um destino tácito.
Estava fadada a protestar com moderação, a conter-se e ser a perpétua cúmplice das aventuras mornas de uma estranha.
Que ironia esta, era um simples efeito do corpo sob a luz, mas era tão mágica, tão misteriosa. Tantas coisas intrigantes nascem na sombra. Por momentos parecia sorrir sem ser percebida.
Adorava quando tangia por segundos uma ou outra forma, um outro efeito sob a luz. Era impenetrável e inatingível, um espectro que se agitava . Não poderia jamais ver-se crescendo, alongando seus braços e pernas sob os ângulos do mundo. A semente não conhece o destino da flor.
Que triste achava a vida de uma sombra, arrastada no melhor da festa. Estava ali a saber tudo o que acontecia, a colher as lágrimas e ouvir os risos. Ela vibrava no submundo da fantasia como uma idéia insepulta esquecida . Era como um livro sem letras que contava sua história na dimensão de sonho que alguém lhe emprestava. Um rabisco caprichoso e cheio de audácia, um enigma ou um ponto obscuro e desconcertante. Uma mímica sem lógica que que vive do lado de fora da caverna(de Platão) a espera de qualquer razão.
beijo sombrio
E quando a sombra nos envolve...
Nenhum comentário:
Postar um comentário