domingo, 28 de novembro de 2010

Quem não se comunica se trumbica...

Neste último sábado enquanto um Sócrates operário da construção civil quebrava o piso da minha área a procura de um esgoto ( e quiça o que mais) disparando elucubrações sobre as idéias de um livro que portava orgulhoso chamado " A pirâmide desvelada"( segredos da pirâmide de Gizé), eu me reunia com alguns colegas de trabalho para discutir questões variadas e muito saborosas sobre como estabelecer contato, como atingir  a essência focada atualmente pelo MEC no que tange a competência leitora e interativa a ser desenvolvida e ou despertada nos pequenos e grandes, assim como  o caminho matemático apontado para a questão, ou seja, problema com suas variáveis e possíveis soluções. Leia-se possíveis soluções de forma aberta, flexível. Ser flexível para o educador hoje é mais importante do que ter mestrado.
O interessante neste fato é que é muito rico em possibilidades e vertentes. O caso do filósofo operário,  me fala sobre a competência leitora do autor pedreiro de teses, demonstrando que em qualquer idade e condição social é possível encontrar situações que ilustram este desafio. No caso do pedreiro o despertar pela leitura nasceu de sua paixão por desvendar os mistérios da existência e da necessidade  de se exilar das circunstâncias penosas que cercavam sua infância e juventude. Este encontro com a literatura  foi fomentado por seu contato com o google, que lhe abriu as portas da informação e das novas tecnologias. Hoje também serve de abrigo contra as adversidades que ainda assombram sua sobrevivência recortada pelo alcolismo , por relações conflitantes com filhos desajustados e pela perda precoce da esposa com câncer.  A leitura é sua grande aliada.
Observar estes ingredientes e transformá-los em possibilidades e soluções é um longo trabalho.
Uma das colegas presentes contou que espantou-se ao perceber que a filha de dois anos corria em volta dela enquanto ela lia e tentava entender o que mãe estava fazendo ali parada durante tanto tempo olhando para um objeto com com manchinhas pretas ( um livro). Uma criança de dois anos entende o mundo como pura atividade e isto nos leva de volta ao mundo das descobertas. Como foi seu primeiro contato?
Uma das minhas colegas trouxe a língua, a gramática e a dificuldade de operacionalizar tudo num contexto , ou seja expressar e entender corretamente.
Há tempos atrás eu tive a sorte de ler um texto muito interessante enfocando a arte, que analisava a trajetória de nossa evolução, desde as primeiras formas de expressão oral até  o desenvolvimento da língua falada. Articular sílabas e palavras foi um longo processo de descoberta que transformou nossa espécie. Aí está , em minha modesta opinião a chave para toda a questão.
A partir do momento em que compreendi que o desenvolvimento da linguagem oral e posteriormente escrita foi concebido a partir de uma necessidade de sair do isolamento no qual vivíamos passei a entender a expressão e compreensão do outro como um grande desafio.
A linguagem através da qual nos expressamos e buscamos decifrar o outro é uma habilidade que desenvolvemos a fim de nos revelarmos, nos mostrarmos , nos comunicarmos com o mundo. A linguagem veio nos salvar da solidão, nos socializou.
Quando compreendemos este instrumento como uma prerrogativa crucial desenvolvida por nossa espécie podemos assim avaliar a grandiosidade do ato de expressar-se, mostrar-se, contar-se através das letras , palavras e falas. É um grande dom articular-se.
Deste ponto de vista comunicar-se é um desafio, entender a sintaxe acaba sendo uma consequência natural do fato de precisar tornar-se inteligível e ou dizer-se corretamente.
Fazer-se entender não é simples, interpretar o interlocutor muito menos. Estas habilidades quanto mais praticadas mais nítidas.
Neste momento, portanto, quando escrevo este post, tento expor meu pensamento, contar minha vivência e exalar um pouco do que acho que aprendo. Posso estar sendo clara ou confusa, interessante ou desinteressante, bem sucedida ou mal sucedida em minha tentativa de manifestação.
Durante a reunião , que foi patrocinada pela Saraiva, uma colega trouxe a análise sintática que jamais havia aprendido a usar corretamente.Não sei se alguém já aprendeu corretamente,mas entender regras não é o mais importante. As malditas exceções podem parecer absurdas quando diagramadas num compêndio de regras sobre objeto direto, indireto, adjunto adnominal, adverbial e por aí afora, mas se observarmos a sintaxe como a forma de organização da linguagem escrita, como um facilitador de nossa expressão, torna-se outra a relação.
Comunicar-se é desafiador e em última instância é para tanto que vivemos em sociedade. Nosso outro mundo interior precisa que aprimoremos nossa forma de comunicação, precisa nos mostrar com precisão, limpidez e clareza. Eis como vejo.
Existem inúmeras formas para expressar-se, a arte é a mais ampla, afinal foi lá que começamos a nos tornar mágicos. Sejamos metafóricos, metalinguísticos , artísticos , teatrais, visuais, enfim, sejamos geniais. É preciso digerir o mundo.
As palavras são como substâncias digestivas do pensamento, entendê-las é fazer a primeira viagem a Lua, é estabelecer contatos imediatos no enésimo grau. É descobrir a senha para entrar na festa.

Um comentário:

Sueli Maia (Mai) disse...

Melinda,
respondendo uma de suas questões: sim, você conseguiu expor com imensa clareza o seu pensamento.
Encontrei momentos preciosos em seu texto (aula):

A metáfora de palavras como enzimas digestivas nos ajudando a 'digerirmos o mundo' isto foi bárbaro.

Então concluirei dizendo que você, certamente, descobriu "a senha para entrar na festa."

P.S.

Estes dias encontrei uma excelente dissertação sobre interpretação de textos metafóricos por crianças do 9º ano.

Destaco ainda este trecho:
"Sejamos metafóricos, metalinguísticos , artísticos , teatrais, visuais, enfim, sejamos geniais. É preciso digerir o mundo."
Genial!

abraços e grata pela visita e comentário no 'inspirar-poesia'